Ter utilidade para alguém é uma coisa muito cansativa. É verdade que é algo que nos realiza. Humanamente falando, é interessante nós termos determinadas coisas ou sabermos fazer determinadas coisas, e sabermos que alguém gosta de nós por isso, mas eu acredito que a utilidade é um território muito perigoso, porque muitas vezes a gente acha que o outro gosta de nós, mas não. Ele está apenas interessado naquilo que a gente faz por ele. E é por isso que a velhice é esse tempo onde passa a utilidade e fica só o nosso significado como pessoa. Eu acho que é um momento em que nós ficamos purificados. É o momento em que a gente vai ter a oportunidade de saber quem nos ama de verdade. Porque só nos ama, só vai ficar do nosso lado até ao fim, aquele que depois da nossa utilidade ter acabado, tiver descoberto o nosso verdadeiro significado.
Por isso eu peço sempre para poder envelhecer ao lado das pessoas que me amam. Aquelas pessoas que me possam proporcionar a tranquilidade de ser inútil, mas ao mesmo tempo, sem perder o valor. Alguém que saiba acolher a minha inutilidade. Alguém que olhe para mim assim, que possa saber que eu não sirvo para muita coisa, mas que eu continuo a ter o meu valor. Porque a vida é assim mesmo. Se tu quiseres saber se o outro te ama de verdade, é só identificar se ele seria capaz de tolerar a tua inutilidade. Queres saber se tu amas alguém? Pergunta a ti mesmo: quem nesta vida poderia ficar inútil para ti, sem que tu sentisses o desejo de jogá-lo fora? É assim que descobrimos o significado do amor. Só o amor nos dá condições de cuidar do outro até ao fim. Por isso eu digo: feliz aquele que tem, no final da vida, a graça de ser olhado nos olhos e ouvir alguém dizer: “tu não serves para nada, mas eu não sei viver sem ti”.
Texto de Fábio de Melo