Para aqueles que não se cansam de iludir os outros
Eu vi-te em frente a um bar a sorrir com outra. Aparentemente, vocês estavam felizes. Aparentemente, as coisas estavam muito bem. Ela olhava-te como se pedisse (como eu te pedi um dia) para aquele momento nunca acabar. Só passaram algumas semanas desde que tu te calaste e me deixaste sem respostas. A tua partida ainda é recente, mas tu já decidiste que não vais perder tempo. Tu tocavas nela com afeto, entrelaçavas os teus dedos no cabelo dela e sorrias. Ela parecia estar totalmente entregue a ti, só conseguia olhar-te, beijar-te e sorrir para ti como se não existisse outra pessoa no mundo capaz de fazê-la sorrir e sentir o que estava a sentir. Aparentemente ela sentia-se segura (como eu também me senti um dia) contigo.
Caiu uma gota de cerveja no vestido dela, tu pediste desculpas. Colaste o teu olhar ao dela e deixaste-a corada. O telefone tocou, atendeste a chamada, deixaste-a alguns minutos sozinha e voltaste para a mesa a dizer que foi um amigo. Tu conversaste sobre ela com ele, disseste que ela era linda, falaste da cor dos olhos dela. Depois de voltares para a mesa, apertaste o queixo dela, tocaste na ponta do nariz e, mais uma vez, elogiaste-a. Na mesma noite, elogiaste o vestido, a pulseira dourada, o cabelo, o canto dos olhos, o sinal no pescoço, os lábios, os beijos, e quando não sobrou mais nenhum lugar para enfiar os teus elogios, tu pediste mais um beijo. Sem pensar duas vezes, claro, ela beijou-te.
Quando acabou o assunto, tu perguntaste quando vocês poderiam encontrar-se de novo. Antes de te despedires disseste que já estavas com saudades e que já só querias que chegasse o próximo fim de semana. Era domingo e tu desejaste que ela dormisse bem. Chegou segunda-feira e tu ligaste para dar um bom dia, perguntaste como é que ela estava, decidiste convidá-la para se encontrarem depois da aula, sugeriste um gelado na terça, uma pizza depois do trabalho na quarta, um cinema na quinta, um passeio à noite na praia na sexta. No sábado, convidaste para um café, depois para um bar. No domingo, tu propuseste um almoço, depois um filme em casa, um banho de chuveiro a dois e uma sesta no final do dia. Por fim, prometeste ficar e mais uma vez não cumpriste. Tudo tão rápido, intenso e extremamente confuso, como tu sempre foste.
Ela trocou a foto do perfil no Facebook, tu comentaste com um coração. Declaraste-te com uma letra de uma música romântica, levaste-a para conhecer a tua família, apresentaste-a para os teus amigos, foste ao shopping de mãos dadas, assististe ao filme de comédia romântica que estava em cartaz, dividiste o refrigerante, ofereceste pipocas na boca dela. Falaste em saudades, disseste que querias sentir o cheiro do perfume, disseste também que querias voltar a tocar na pele dela e que estavas com saudades de sentir o cheiro de sabonete pela casa e vê-la enrolada na sua toalha. Disseste que a casa estava vazia, convidaste-a para dormir por lá, compraste um vinho para acompanhar. Conversaste sobre filmes, sobre comida, sobre música, bandas, viagens e depois, partiste. Tu és exatamente o mesmo quando te conheci. Juro que, por um momento, acreditei que desta vez tu ias levar o amor a sério. Até que tu resolveste continuar a ser o idiota que sempre foste. Evitaste as conversas dela, deste milhares de desculpas para não ires ao bar, ou tomar um café, ou comer um sushi, ou dormir ao ver um filme, ou beijar no escuro do cinema, ou um banho de chuveiro a dois, ou sorrir como se não houvesse amanhã. Nem sequer um telefonema para dizer: ”vou desaparecer da tua vida, desenrasca-te!”.
Podes não querer estar mais com alguém, mas não precisavas criar tanta expectativa no outro, muito menos dizer que irias ficar quando já estavas de saída. A tua vida sempre foi o mesmo ciclo. Tu sempre tão instável, sempre com as mesmas conversas, com as mesmas desculpas, com os mesmos gestos, com as velhas frases e uma lista que cresce a cada uma que se envolve e se deixa enganar por ti. Tu trocas de amor como se trocasses de cuecas e prometes a todas, um mundo que nem mesmo tu conheces. O teu amor é inventado, a tua saudade é idealizada, a tua presença é por um triz, o teu olhar é infeliz, o teu prazer é só passagem, a tua vida é uma viagem cujo destino tu nem sabes, a tua voz é a mesma, as tuas promessas são incertas e tu, não és tão seguro quanto pareces ser.
Quando vos vi aos dois, a vontade que tive era de perguntar qual o dia em que tu irias desaparecer e deixá-la sem respostas. Mas preferi ficar na minha, acompanhar o desfecho e torcer para que, desta vez, tu fosses o iludido da história. Eu esperei, sinceramente, que ela não fosse só mais uma na tua lista. Agora, só desejo que ela não se perca a cada dia como eu me perdi. Que ela se encontre e se perceba, que sinta por ela todo o amor que sentiu por ti e que, de uma vez por todas, compreenda que tu és só mais um puto a tentar agir como se fosses um homem de verdade, mas que talvez nunca conseguirás sê-lo. Só desejo que ela aceite que tu não a mereces e que, apesar do que fizeste, que ela jamais deixe de acreditar no amor.
Texto de Iandê Albuquerque