Uma vez li em algum lugar que os relacionamentos são como as casas: quando uma lâmpada queima tu não mudas de casa, trocas a lâmpada. Nunca me esqueci disso. Sobretudo porque às vezes acho que as pessoas não estão a ter vontade para trocar lâmpadas, nem para cuidar de casa nenhuma.
Claro que não venho aqui com um discurso antiquado e equivocado, de que as pessoas devem aceitar viver em relacionamentos infelizes. Isso nunca. A vida é muito curta. O que me venho perguntando é se as pessoas não estão a desistir cedo demais.
Pergunto-me se as pessoas não estão a confundir os relacionamentos da vida real com os dos finais de filmes. Até porque os filmes não se preocupam em mostrar-nos que o “felizes para sempre” é uma construção marcada também por alguns dias infelizes.
Fico a pensar: se as pessoas investissem muito dinheiro num negócio, numa pequena empresa, como projeto de vida, quanto estariam dispostos a lutar por ela? Quantas noites mal dormidas aceitariam em nome de um projeto no qual elas apostaram tantas fichas? Quantas chatices: conversas com o contador, prestação de contas, cobranças de clientes? Eu tenho a certeza de que quase todos os que conheço aguentariam firme, com coragem, compromisso e foco para concretizar essa meta.
E questiono se essas pessoas investiriam esse mesmo tempo, essa mesma energia, se teriam tanta paciência e compreensão com os momentos difíceis dos relacionamentos que elas decidiram viver. Se elas também pensariam “isto é um projeto de vida, é algo que estou a construir e que nem sempre vai ser fácil ou divertido”. Será que as pessoas cuidariam dos seus amores de forma tão decidida quanto cuidariam do seu património?
Eu fico assustada. E acima de tudo, fico triste. Não acho a menor graça em ver os meus amigos a sair de casa. Nunca vou olhar com naturalidade para o rompimento, para o despedaçar dos sonhos a dois, para o fim de tantos planos, de viagens não feitas, de histórias não vividas.
Sim, os problemas aparecerão. As pessoas interessantes aparecerão. A tampa da sanita estará levantada. Os sapatos estarão no meio do caminho. A colega do trabalho estará mais arrumada do que a tua mulher na hora que acordou. Mas tu não viste a colega do trabalho a acordar. Porque ela não faz isso no trabalho, só na casa dela. Sabes? É muito fácil – e muito juvenil – cair nessas ciladas.
Uma coisa é constatar, depois de muitas tentativas, depois de diálogo e de uma busca, sedenta e sofrida, por soluções, que o casal não quer mais seguir o mesmo rumo. Que os planos já não harmonizam. Que a música que está a tocar já não é a mesma para os dois. É triste, mas pode acontecer e temos a sorte do século XXI nos dar todo o aparato para não sermos escravos de relacionamentos mortos.
Mas acho mesmo que tem muito relacionamento a ir para a forca quando poderia ter passado pela enfermaria, pelo pronto socorro. Acho mesmo que existe muita gente que acorda esquisita um belo dia e resolve mandar tudo pro car*lho – os seus sonhos e os sonhos do outro.
Acho mesmo que existe muita gente a ser egoísta, comportando-se como crianças mimadas que se cansaram de um brinquedo mais antigo porque ele já tem algum pó, perdeu alguma peça ou porque existe um novinho lá na loja do shopping. Ou porque o brinquedo já precisa de trocar a pilha, mas sabes como é, sair, comprar a pilha, abrir o pacote, substituir uma por uma… Dá trabalho demais. Esse brinquedo pode ficar no passado. O consumismo não ficou só nas prateleiras das lojas.
Não é por moralismo. Não é por respeito às instituições. É por respeito ao amor. É por respeito a quem dorme na nossa cama. É porque eu acho, cada vez mais, que somos uma porra de uma geração mimada, que aceita os desafios da carreira, dos estudos e do dinheiro, mas que não tem paciência nem para o primeiro desafio da convivência e que não tem tempo nenhum para “perder” na construção diária do amor.
Texto de Ruth Manus