Querido/a ex.
Não sei se sabes, mas depois que tu te foste embora eu torturei-me um bocado com tudo o que vivemos. Questionei. Duvidei de mim mesmo. Culpei-me. Lembrei-me do nosso primeiro beijo que se encaixou perfeitamente. As nossas expectativas que se encontraram, os nossos destinos que se cruzaram. Eu não conseguia acreditar que tudo o que vivemos juntos acabaria dessa forma. Tu fugiste. Partiste sem te importares. Eu precisei de ti, tu não apareceste. Eu chamei-te, tu mentiste. Implorei que tu viesses, tu não vieste. Eu preso, tu livre. Tive que me desenrascar sozinho enquanto tu andavas por aí. Rezei para que chegasse o momento de te esquecer, mas só me lembrava. Jurei não mais me importar, e só me importava. Deixei de te seguir, mas acompanhei os teus passos pelas redes sociais.
Tu fizeste-me feliz. Fizeste-me muito bem, mesmo. Esforcei-me para ser quem tu esperavas que eu fosse. Fiz inúmeras coisas para te impressionar e tive as atitudes mais ridículas só para te ter por perto e não te perder. Eu só não consegui entender como tu tiveste a coragem de ser tão frio comigo. Falaste-me sobre ti, permitiste que eu entrasse na tua vida, apresentaste-me aos teus pais, fizeste-me conversar com o teu melhor amigo sobre o amor e como tu me fazias senti-lo tão bem. Convidaste-me para dormir na tua casa, levaste-me para provar as tuas tardes, permitiste que eu entrasse nas tuas manhãs e aproveitasse as tuas noites. Levaste-me para uma sexta-feira que nunca mais esqueci. Passei por todos os dias da semana contigo, e incontáveis horas ao teu lado. Marquei o teu dentista porque tu não tinhas tempo, acordei-te porque tu adormeceste e não ouviste o despertador tocar. Atrasei-te para o trabalho, tu atrasaste-me para a aula de segunda-feira com aqueles pedidos para ficar mais um bocadinho. Trouxe-te para a minha vida, fiz morada na tua vida, acampei no teu peito, viajei para um lugar que não sei bem explicar, só sei que foi duro aceitar a viagem de volta.
Saudades? Eu tive, às vezes. Saudade de quando tu cozinhavas para mim um prato louco que tu tinhas aprendido a fazer na Internet. Saudades de quando tu preparaste a tua vida para mim, quando tu permitiste que eu entrasse e me fizeste sentir à vontade. Saudades de quando tu me perguntavas – com um tom de ciúmes – quem era aquele amigo/a bonito da foto que tiramos no jantar de colegas do secundário. Saudades eu tinha do teu beijo na escada rolante do shopping, na escadaria do teu prédio, no assento do cinema de um filme que nós nem nos importávamos de ver, na praia, em viagem, nas festas, na rua, no elevador do prédio do teu amigo, no sofá, na cozinha e em todos os outros lugares que passamos juntos um dia e hoje não passaremos mais. Saudades eu tive de te abraçar por trás, de vendar os teus olhos e te fazer descobrires-me, de olhar nos teus olhos e descobrir-me em ti, de olhar nos teus olhos e sentir o teu beijo sem precisar tocar-te. Saudade eu tive de quando tu me esperavas, de quando respeitavas os meus atrasos, de quando aceitavas a minha vida como ela sempre foi, meia desorganizada e confusa. Saudades eu tinha de quando tu desarrumavas a minha vida toda, mas depois voltavas para arrumar.
Vi que tu te envolveste com alguém de olhos claros e eu culpe-me pelos meus olhos castanhos escuros. Tu conheceste uma pessoa mais alta do que eu e eu culpei-me pelos meus 1,70m. Tu namoraste uma pessoa forte e eu culpei-me por não ter tanto porte assim e ser fraco ao ponto de chorar ao ver-te bem sem mim. Começaste a namorar uma quarta pessoa, ou talvez uma quinta. Escreveste uma frase de uma música – que deveria ser nossa e não foi – como legenda nas fotos. Terminaste o namoro. A tua vida era sempre a mesma. O mesmo ciclo. O mesmo final para todas as pessoas que se envolvessem contigo. Acordei depois das 13. Subscrevi ao Netflix. Passei um domingo inteiro a ver filmes. Neguei convites. Dispensei tanta gente simpática que queria passar algum tempo comigo. Perdi a disposição de conhecer outras pessoas porque toda a gente parecia igual e a essa altura do campeonato, era melhor eu proteger-me. Achei que ausentar-me e afastar-me do amor e negar as oportunidades que ele me dava era uma boa opção para não me magoar de novo. Foi uma péssima opção.
Reencontrei-te numa festa e tudo o que eu queria era dizer-te que estava tudo bem comigo, pedir-te para voltares como se nada tivesse acontecido, aceitar o teu erro e tentar outra vez. Mas tu abraçaste outro alguém e acenaste um olhar de adeus. No outro dia tu ligaste-me, perguntaste-me se o CD que me tinhas emprestado há meses atrás ainda estava comigo. Tu querias ouvir o que a minha voz iria dizer sobre aquele dia. Eu disse que não, já te tinha devolvido há muito tempo. Passei a ter raiva de ti, a não te aguentar mais. Tive pena de ti e parei de sentir pena de mim. Resolvi sair. Libertar-me de vez de ti e nem sei dizer-te o que é que eu fiz para preencher o vazio que tu deixaste. O inútil deu lugar ao útil.
Só quero dizer-te que não precisas ligar-me outra vez, nem tentar explicares-te. Eu já encontrei todas as explicações para o que tu fizeste, já entendi que a culpa não foi minha e que ausentar-me para o amor é um erro. Disseram-te que eu estou bem. Tu viste-me com outro alguém. Tu ligaste a pedir para me veres, disseste que querias conversar, pediste permissão para te explicares, mandaste mensagem a pedir para tentar outra vez, disseste que te arrependeste de tudo o que fizeste e que andavas a sentir a minha falta. Mas é que agora, agora, eu sinto-me amado. De verdade. Sinto-me feliz. Disseram-me que um dia eu ia rir de tudo isto. E não é que eu me estou a rir agora?
Texto de Iandê Albuquerque