Desabafo sobre o amor
O amor não é justo. O amor nunca foi justo.
O amor é aquele miúdo da tua escola, do primeiro ciclo, que te atirava um milhão de palavrões infantis só porque tu tinhas os dentes da frente abertos. O amor é aquela caixa de morangos que parecem estar maravilhosos e, quando tu abres, descobres que todos os que estavam no fundo estão podres. O amor é aquela secção de calças de cintura alta perfeitas, tamanho 32, que não cabem nem mesmo em modelos.
O amor não é justo. E, talvez, o problema resida não no sentimento em si, e sim no timing. Duas pessoas, quando se encontram, têm a possibilidade mínima de se encontrarem exactamente na mesma fase da vida. Não importa se tu és magra, loira e tens os olhos azuis, se o rapaz não está interessado em namorar agora. Não importa quantos abdominais tu tenhas na tua barriga malhadíssima, se o outro te acha um chato. Conheci muita gente e apaixonei-me por cada uma delas – paixão é sim, uma forma mínima de amar, por menor que seja. Conheci gente demais em tempos errados demais. Hoje, percebo o quanto estive errado em cultivar mais expectativas do que a mim mesmo. Descobrir-se é a primeira etapa do processo “amar”: amar a si mesmo. Amar quem tu és, na essência. Decidi aos nove anos de idade que profissão iria ter. Hoje, percebo o quanto me envergo em caminhos diferentes e alternativos, por poder, livremente, ser o que sou. Cada um de nós deveria, antes de tudo, descobrir-se. Abrir-se ao mundo. Há muito a ser explorado, tanto na sua alma, quanto no seu corpo, quanto na sua cidade – imagina o quanto pode haver no mundo inteiro, então. E, o amor (ok, conversa de auto-ajuda, mas que jamais deixará de ser verdade) só é possível quando descobrimos que o outro está ali para somar, e não completar. Não podemos ver no outro qualidades que sentimos não existir em nós mesmos – o que cheira a inveja – e muito menos esperar que o outro nos trate como uma mãe ou um pai. Carência demais é doença. Agarrar a primeira coisa que se vê só mostra o quão fraco e necessitado tu te tornas a cada segundo em que estás sozinho. Desejar a companhia de alguém é uma coisa; imaginar o outro como um escravo particular para curar as suas inseguranças é outra.
E é por isso, e por tudo o que ainda posso ser, que descobri – e, por mais incrível que possa parecer, apaixonei-me por esta possibilidade – que não estou pronto para amar. Não estou pronto porque ainda tenho muito a fazer – conhecer o mundo é só o primeiro passo. Sair da nossa zona de conforto traz-nos tanta, mas tanta lucidez que voltar para a caverna torna-se impossível. Construo-me com passos leves, calmos e muito – mas muito mesmo – despreocupados. E acho que esse é o melhor conselho que poderei dar a alguém, quando me perguntarem sobre felicidade.
Vá ser feliz contigo mesmo. A única coisa que te merece é o mundo – não somos prémios particulares, nem bónus de carregamento de telemóvel, nem números de um sorteio da sorte qualquer. Somos indivíduos que, querendo ou não, doendo ou não, nascemos e morremos sozinhos. Encontrar alguém que, ao invés de nos roubar, queira acompanhar-nos nessa jornada, é a nossa árdua missão particular – recebe-se o que se é refletido. Se atrás de ti só tem gente louca, provavelmente quem está a fazer algo errado és tu. Descobre-te. Valoriza-te em todos os teus trejeitos. Usa algo mais curto (ou mais comprido). Dança. Viaja. E, quando, por poesia – por descuido não, por favor! – alguém queira ficar, que seja para acrescentar.
Porque o amor não é justo. Mas ele há-de acontecer, um dia.
Texto de Luiz Menezes