Mãe, obrigado de coração por não teres criado uma princesa
Mãe, a vida tem compromissos urgentes e sérios. Obrigada por me teres avisado e me mostrado cada um deles. Obrigada por não teres omitido de mim as durezas do mundo. Obrigada por não me teres protegido.
Preferiste as hipérboles aos eufemismos. Sempre te achei exagerada. Dramática. Eu sei que não foi fácil para ti assistir a cada queda, a cada erro meu. Sei que eu te quis culpar por não seres como as outras mães que mimavam exageradamente as filhas. Tu foste forte.
A vida é um grande levanta-e-cai. Mãe, obrigada por não teres construído um castelo ilusório ao meu redor.
Obrigada por me mostrares que o pão custava muito, que precisava diminuir o tempo no banho para economizar energia. A vida tem um custo alto, mãe. Ainda bem que tu não criaste uma princesa. Eu hoje não saberia fritar um ovo. Ainda bem que tu não sustentaste nenhuma vaidade, porque me fizeste ver que eu era maior que isso.
Tu criaste-me para o mundo, e este, o mundo real, não poupa as princesas. Obrigada por não me teres criado para esperar o príncipe do cavalo branco que resolveria todas as minhas aflições. O que a vida quer de nós é peito aberto e coragem para seguir em frente.
Mãe, a minha cara está dormente, mas eu não desisto. Eu tropeço tantas vezes e tantas vezes me equilibro de novo. Mãe, eu mato a barata, mesmo estando cheia de medo. Eu encaro o dragão, se for preciso, mesmo estando com medo. Do jeito que sei e posso. O que não posso, mãe, é negar o que tu me ensinaste.
Obrigada por não teres criado uma princesa.
Texto de Maria Gabriela Verediano