Não precisas voltar.
Eu nunca fui daqueles que espera por alguém quando alguém decide ir sem dizer se vai voltar. Provavelmente se tu fores eu não ficarei à tua espera até à próxima estação. Eu não tenho paciência para esperar na fila do banco, para aguardar na paragem de autocarro, nem para esperar a noite passar se a conversa não me agradar. Não gosto de regar e alimentar as minhas expectativas, muito menos criá-las em alguém. Não sou desses que sai por aí a tentar encontrar o tal equilíbrio imediato depois de um ponto final. Se tu fores, eu não me vou equilibrar direito. Talvez eu não consiga dormir por algumas noites, talvez tu ocupes os meus sonhos e interrompas o meu sono por alguns dias.
Talvez algum amigo pergunte por ti e eu fique sem chão para dizer. Talvez, quando a noite chegar, eu sinta vontade de te ligar, depois de ter passado toda a tarde a pensar porque diabos tu decidiste partir. Talvez eu pare por aí, em algum lugar desses em que as pessoas costumam estacionar para reconhecer os erros, ou encontrar possíveis acertos e retratar a vida. Ou talvez eu pare por aqui mesmo, dentro de mim, e tente encontrar-te loucamente. Tente puxar-te daqui de dentro e dizer-te: Caralho, olha o que tu fizeste! Talvez eu sinta uma vontade absurda de gritar por ti, volta, volta, mas não, talvez seja melhor não voltares. Talvez eu olhe para algum canto da casa e repare como tu fazias tanto sentido ali, como colorias o meu peito e como decoravas bem a minha vida. Talvez eu vasculhe as mensagens no telemóvel e aí eu me lembre que tu me esqueceste. Não existe nenhuma mensagem tua. Nem de boa noite, nem sequer um não volto mais. Talvez eu ganhe coragem para falar contigo no WhatsApp depois de ter passado horas a olhar para o horário em que tu visualizaste a última mensagem e escreva qualquer besteira, qualquer coisa mesmo que não tem nada a ver contigo, e só então, te peça desculpas por tudo. Talvez eu acesse o teu perfil no Facebook, leia as tuas últimas publicações e confira se tu apagaste aquela nossa foto a fazer biquinho. Talvez eu sinta uma saudade absurda de ti. Não uma saudade de te encontrar, uma saudade de quando a gente não tem mais aquilo que a gente tinha. Talvez, depois de ver o trailer da continuação daquele filme que nós vimos juntos, em que tu derrubaste uma Coca-Cola em cima de mim, eu encontre um propósito para esperar tu voltares antes da estreia.
Se tu fores, mesmo que os meus amigos me convidem para sair e aproveitar o final de semana, talvez eu não consiga encontrar muito sentido. Talvez eu beije alguém entre o escuro da discoteca e as luzes néon, e até troque telefones, conversas no ouvido e, por um momento, talvez, a gente se entenda, mas aquela pessoa não serás tu e então eu voltarei para o momento em que tropeço em ti e acordo meio atordoado no outro dia, à tua procura e a tentar entender porque é que as tuas coisas não estão mais aqui, e porque é que eu sinto que tu foges de mim mesmo quando ainda tento amenizar a tua ausência com outra pessoa. Talvez eu nunca entenda porque é que tu escolheste sair assim, sem cortesia, sem despedida. Talvez eu sinta o teu perfume por pelo menos três vezes em diferentes lugares e converse em silêncio comigo para entender se tu me segues, ou se os meus sentidos se enroscaram desde quando tu bateste a porta pela última vez. Talvez eu me lembre de ti em qualquer objeto que tocar, sem exageros, pode ser um travesseiro, o tapete vermelho na porta de entrada, as chaves de casa, ou em qualquer lugar que eu visitar, pode ser no Porto ou em Lisboa. Talvez eu nunca te esqueça, mas foda-se! Eu vou ficar bem.
Eu abro sempre mão do que está a ir embora. Se tu escolheste ir, é melhor correres para agilizares o processo da saudade, para acelerares as lembranças e aliviares a dor que vai vir mas que vai virar passado um dia. Talvez eu me lembre do dia em que fizemos aquele almoço quando decidimos comemorar o nosso aniversário em casa. Não por falta de dinheiro, mas sim por excesso de vontade de estamos só nós, sem empregado de mesa ou gente ao lado para aturarmos. Talvez eu me lembre do dia em que tu me trouxeste remédio à cama só porque eu estava com uma dorzinha de cabeça. Talvez eu lembre do dia que tu gravaste um vídeo no teu telemóvel quando eu dormia de boca aberta. Então vai com pressa e não voltes, nem olhes para trás. As pessoas costumam voltar para estragar ainda mais o que ficou quando não conseguem seguir viagem. Não voltes, não. Segue a tua viagem que eu revejo o meu destino para ninguém se odiar depois.
Texto de Iandê Albuquerque